De 28 de fevereiro a 2 de março, realizou-se na Mariápolis Ginetta o seminário acadêmico “América Latina e o desenvolvimento que queremos”. Organizado pela Associação Civitas em parceria com a Editora Cidade Nova, o evento reuniu 33 pesquisadores provenientes de diversos países do subcontinente: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Peru e Venezuela. Em comum eles têm o fato de dedicar suas pesquisas a projetos de desenvolvimento social na região.
Durante os quatro dias de simpósio, os estudiosos puderam não apenas compartilhar suas experiências pessoais e intelectuais, mas também aprender com especialistas em diversas áreas, como Ladislau Dowbor, Daniel Arroyo, Marina Silva, Bernardo Kliksberg (cuja conferência, realizada no Memorial da América Latina, em São Paulo, foi aberta ao público) e Ricardo Abramovay, entre outros.
Tudo com o objetivo de promover um resgate de valores éticos que permitam a reconstrução da sociedade sobre bases mais fraternas, como bem ressaltou Klaus Brüshcke, diretor da Editora Cidade Nova, na abertura dos trabalhos. Somente a fraternidade, completou Sérgio Previdi, diretor da Civitas, poderá nos guiar na busca do bem comum. Um sonho que, nas palavras do cientista político Juan Esteban Belderrain, começa a se realizar com a formação de novas lideranças para a América Latina.
 
Desenvolvimento social e políticas públicas
Em uma palestra dinâmica e propositiva, o ex-vice-ministro de Desenvolvimento Social da Argentina, Daniel Arroyo, trouxe muitas reflexões sobre a situacão atual do subcontinente e suas perspectivas para a próxima década.
“Em termos estruturais, o grande dilema da América Latina, na atualidade, é o domínio da fragmentacão social”, afirmou Arroyo. “Muita gente participa politicamente, porém de um modo bastante disperso”, complementou. Essa baixa capacidade de organizacão social, aliada ao momento histórico atual, muito propício ao crescimento contínuo na região na próxima década, é um estímulo para que seus cidadãos inventem e transformem suas realidades, contribuindo para a construção de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento social.
Economia e desenvolvimento
Embasando-se em dados irrefutáveis, o economista Ladislau Dowbor procurou demonstrar como o atual modelo econômico, baseado no consumo excessivo, é completamente insustentável. Aumento das temperaturas no Hemisfério Norte, perda das florestas tropicais, aumento da concentração de CO2, extinção das espécies, uso exagerado de veículos motorizados, exaustão da água e degradação da camada de ozônio: problemas planetários que, ressalta Dowbor, necessitam de soluções planetárias, mas não encontram instituições políticas de tal alcance capazes de implementá-las.
É por esse motivo que, segundo ele, o grande desafio de conferências internacionais como a Rio+20 não é tanto pensar em “quais” mudanças devem ser feitas, mas no “como” realizá-las efetivamente. Nesse sentido, a grave crise econômica que se abateu em todo o mundo nos últimos anos pode constituir-se como uma oportunidade para o estabelecimento de um novo modelo de desenvolvimento, baseado no equilíbrio ambiental e social.
Por uma liderança a serviço
Um momento de profunda reflexão e inspiração para a transformação social foi a conferência da ex-Senadora e ex-Ministra do meio ambiente Marina Silva. Partindo de sua rica trajetória – iniciada nos seringais da Amazônia –, Marina presenteou os participantes com uma lúcida análise do atual contexto socioeconômico e ambiental e com claras indicações das mudanças necessárias.
“O que fazer para que sejamos, no mundo inteiro, economicamente prósperos, socialmente justos, culturalmente diversos e ambientalmente sustentáveis?”, questionou ex-Ministra. É necessária uma outra visão de mundo, menos focada no ‘ter’ e no ‘fazer’, ou seja, menos consumista, e mais centrada no ‘ser’, comprometida com o mútuo serviço: “Eu nasci numa rede de serviço. E num regime de serviço, a gente sobrevivia e permitia que outros sobrevivessem. Havia uma unidade de serviço, com muitas pessoas compartilhando suas habilidades, formando assim um corpo”, explicou Marina, relembrando sua infância na Amazônia.
Prosperidade, concluiu, não é o acúmulo contínuo de riquezas, mas a garantia de condições dignas – saúde, educação, cultura etc. – para todos. Como realizar uma mudança de rota? Através de “lideranças multicêntricas para os processos multicêntricos que estamos vivendo”, defendeu a ambientalista. Saber liderar e ser liderado, abrir-se ao diferente, participar politicamente, construir juntos. São essas algumas das características de um verdadeiro líder, na concepção de Marina Silva.
Perplexos, mas esperançosos
1 bilhão de pessoas – quase uma a cada seis – passam fome, hoje, no mundo. 900 milhões de pessoas carecem de água potável. Em 2010, 8,1 milhões de crianças morreram por causas evitáveis relacionadas à pobreza. 121 milhões de crianças não vão às escolas nos países em desenvolvimento. Estima-se que as mudanças climáticas causam 300 mil mortes por ano. Os 10% mais ricos da população mundial possuem 83% de toda a riqueza produzida no planeta. Foi para denunciar tais escândalos e apontar possíveis saídas que o economista Bernardo Kliksberg dedicou sua conferência durante o seminário.
Apesar de sua perplexidade, Kliksberg não hesitou em apontar um perspectivas de esperança e transformação, baseadas no serviço. Para ele, três caminhos podem ser decisivos: o empreendedorismo social, a economia socialmente responsável e o voluntariado. “Estamos caminhando. O gênero humano está encontrando vertentes pacíficas, fraternas, solidárias para responder a esses problemas. É uma grande responsabilidade que vocês têm”, enfatizou Kliksberg aos seus ouvintes.
Mais informações: http://americalatinaquequeremos.wordpress.com/