“Nós gostaríamos de ter ficado com você aqui conosco, mas você voou para o lugar que lhe esperava desde quando você nasceu, escrito com o nome que nós lhe demos: Araceli, altar do Céu. Agora feliz, você pode correr, dançar, como sempre quis”. Este foi um diálogo íntimo e comovente de um pai diante do semblante tranquilo e sereno de sua filha que repousava, preparada como uma noiva diante do altar de Jesus Eucaristia, na Igreja da Mariápolis Ginetta, na manhã do dia 23 de agosto.
Araceli Góes concluiu a sua viagem terrena na noite anterior, depois de um agravamento no seu quadro clínico já bastante complexo. Araceli viveu seus 38 anos numa cadeira de rodas, lutando pela vida. A expectativa dos médicos era de que ela sobreviveria até os oito anos de idade. Toda a sua vida foi um prodígio.
O que mais surpreendia ao vê-la em sua cadeira de rodas, que ela manobrava com grande habilidade, era a luminosidade do seu sorriso.
Um episódio decisivo: um dia, Araceli voltou da escola chorando porque os colegas com quem estava brincando haviam feito uma gozação, dizendo que era paralítica. Sua mãe pegou-a nos braços, colocou-a diante de um espelho e lhe disse: “Olhe Araceli, seus amigos estão dizendo uma mentira? De fato, você é paraplégica. Mas, Deus a ama imensamente!”. Araceli contou, certa vez, que aquele foi o momento da sua vida, no qual fez uma escolha fundamental: ou enfrentaria a sua situação física como um peso ou como um dom de Deus.
A sua irmã, Graziela, esboçando alguns dos momentos mais importantes da vida da Araceli durante a missa de corpo presente, na igreja lotada por uma multidão comovida, disse: “Todos nós temos uma história para contar: as brincadeiras com a sua cadeira de rodas, as risadas características da Araceli, a alegria que irradiava, a criatividade em transformar as situações mais difíceis num trampolim de superação e amor, a sua força de vontade de viver intensamente, a consciência de que o que contava era só viver o momento presente,  a pureza de coração em ver em cada coisa, cada circunstância o Amor de Deus como fruto do seu amor profundo por Jesus Abandonado”.
Chiara Lubich, a fundadora do Movimento dos Focolares ao qual Araceli pertencia, também ficou admirada quando a conheceu. No diário que escreveu em 1991, durante a sua visita a Mariápolis Ginetta, onde Araceli morava com a família, Chiara diz: “Neste lugar o Ressuscitado não resplandece com plenitude somente nos que têm saúde. Vi uma gen paraplégica. Nunca tinha conhecido uma pessoa assim: falava, gesticulava, amava como as outras. Não havia sequer um sinal de inibição no seu rosto pelo seu estado”.
Ginetta Calliari, na sua autobiografia referindo-se a ela dizia: “Araceli vive o Ideal e transmite felicidade, harmonia e paz, [no local] onde vai fazer hemodiálise. Quando ela entra naquele ambiente todos [ficam impressionados], ela, a menorzinha, com aquela serenidade, com aquele sorriso, está despertando uma admiração singular. De onde vem tudo isso? Vem do Ideal.”
Araceli era a encarnação de uma Palavra da Escritura que Chiara havia escolhido para ela: “Deus ama a quem dá com alegria. ”(2Cor 9,7)
Qual era o seu segredo? Ela mesma revela em um seu escrito: “Eu só encontrei a resposta em Jesus, que quando morreu sofreu também por mim. Através desse amor a Ele, a dor se transformou em amor e é esse amor que me realiza e que me dá uma alegria que não passa. Descobri que em cada dor, em cada sofrimento posso abraçar a dor d’Ele, amando quem passa ao meu lado. E as dificuldades se transformam num impulso para eu ir em frente”.
Chegaram muitas mensagens, de várias partes do mundo, das pessoas que a conheceram. Algumas delas foram lidas no funeral. Foi unanime a gratidão pela sua fidelidade, pela alegria e a luz que emanava da dor transformada em amor. Citamos apenas uma, dirigida a Araceli: “Você certamente experimentou um pouco daquilo que os santos chamam de “noite escura”. Mas, quanto mais escura a noite, melhor se veem as estrelas! De fato, pensando em você agora, não posso deixar de me lembrar do Cântico dos Cânticos:
Como és bela, minha amada, como és bela! (…)
Levanta-te, minha amada, formosa minha, vem a mim!
Foram estas palavras do canto que a acompanhou ao cemitério adjacente à igreja, onde agora ela repousa, deixando um perfume de Paraíso.