Simpósio completa uma década, com propostas ousadas para trilhar os caminhos de uma Educação para a Paz em pelo menos cinco áreas: gestão pública, escolas e universidades, saúde, família e social. Uma das propostas está relacionada a encontrar-se com a fonte da paz e, ao mesmo tempo, deixar-se interpelar pela realidade.
Andréa Moreira e Equipe de Comunicação do X Simpósio de Educação Para a Paz-14.11.2023
Entrar em si mesmo, abrir e fechar os olhos: são gestos que podem fazer a diferença na vivência da Educação para a Paz (EPP). Esta foi uma das lições repassadas durante o X Simpósio de Educação pela Paz (EPP) realizado entre 10 e 12 de novembro de 2023, em Igarassu, Pernambuco. O sociólogo Clayton Santana, mestre e doutor em Teologia, detalhou: “Fechar os olhos para escavar em nós mesmos e descobrir aquela Fonte do Bem, do Belo, da Paz e, ao mesmo tempo, abri-los, para enxergar os próximos e as realidades que nos circundam, agir de modo a cuidar do outro, da sociedade, da Natureza.”
A essa introdução se seguiu o ponto culminante do simpósio: a apresentação do texto Ressurreição de Roma, de Chiara Lubich, com os comentários da socióloga Vera Araújo. Além de Doutora honoris causa em 16 disciplinas – inclusive a Pedagogia (pela Universidade Católica d’América, de Washington, EUA) – Chiara Lubich é uma personalidade conhecida mundialmente como fundadora do Movimento dos Focolares e detentora de premiações importantes como o Prêmio Unesco de Educação para a Paz.
A introdução de Clayton Santana e as explicações de Vera Araújo foram fundamentais para que se compreendesse a complexidade, a profundidade e a extensão do olhar que Chiara Lubich lançou sobre Roma que representa o mundo, para descrevê-lo de forma extraordinariamente lúcida. E ainda: para demonstrar como, ao encontrar o Amor, deu-se a atuação pela paz e os direitos humanos da escritora italiana, cidadã honorária do Recife e condecorada com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, uma das maiores condecorações brasileiras, dentre outras honrarias nacionais e internacionais.
Olhar de fogo
Escreveu Chiara Lubich:
“Passo por Roma e não quero olhá-la. Olho o mundo que está dentro de mim e me apego àquilo que tem ser e valor. Faço de mim uma só coisa com a Trindade que repousa em minh’alma […] Tomo contato com o Fogo […] e os meus olhos não mais ficam apagados, mas, através da pupila que é vazio sobre a alma, por onde passa toda a Luz que vem de dentro […] olho o mundo e as coisas; contudo, já não sou mais eu que olho, é Cristo em mim que olha, e vê de modo novo, cegos que devemos iluminar, mudos que devemos fazer que falem e aleijados que devemos fazer andar”.
Em escritos como esse e com sua vida, Chiara deixou claro que o encontro com a fonte do Amor a levou a sair de si, em busca do outro e do Cosmo, abrindo os olhos também para o que Clayton chamou de “feiura” do mundo, os desafios ao redor. O texto é curto, mas denso e mereceu observações inteligentes de Vera Araújo como a referência, por exemplo, ao fato de que Chiara enfrentou as grandes problemáticas da Humanidade cumprindo um itinerário cujas palavras-chave são, dentre outras: reciprocidade, comunhão. E isso, de modo empírico, realizado comunitariamente, em unidade, base para a paz em todos as esferas da atividade humana.
Campos de atuação
Família, comunidades, instituições do ensino básico ao ensino superior, área da Saúde, secretarias dos municípios e estados são, de fato, alguns dos campos nos quais já atuam crescentemente ou atuaram os integrantes do X Simpósio de Educação para a Paz e com experiências de peso como a criação de leis e disciplinas para difundir essa ideia mais e mais. Na versão 2023, o Simpósio de EPP atraiu uma centena de pessoas ao Centro de Formação da Mariápolis Santa Maria, em Igarassu, Região Metropolitana do Recife (RMR), Pernambuco. E contou com mais de 600 visualizações da sua transmissão ao vivo realizada pela TV Tropicana, uma tevê independente do Estado da Paraíba.
Na descrição da Tropicana, o Simpósio da EPP aparece como: “Uma exposição de vivências na Educação, Saúde, Social e Família”. E a TV contextualiza: “Nesses 23 anos, o Projeto Educação para Paz é vivenciado, com resultados exitosos, em Escolas, Universidades, ONGs, Hospitais, Clínicas, em Projetos Sociais, na Família”. No percurso de mais de 20 anos do projeto, segundo os organizadores do evento, “foram realizadas inúmeras formações, e essa é uma nova oportunidade de compartilhar vivências”. Uma partilha que pode ser amplificada justamente pelo trabalho incansável de Pádua Vieira e sua equipe de operadores da Tropicana, um projeto de comunicação também inspirado nas ideias e na vida de Chiara Lubich e a Educação para a Paz.
Fio condutor
A Arte de Amar foi o fio condutor da programação como o é das ações deste vasto projeto, sustentado no Nordeste, no Brasil e no mundo nessas mais de duas décadas. São ações geradoras de frutos comoventes como as apresentações musicais de um adolescente (solo ao violão) e de crianças e adolescentes da Orquestra de Talentos a Serviço da Paz, esta última, na primeira hora do sábado, o dia mais cheio na programação. Essas apresentações também abrem perspectivas para que se multipliquem os artistas engajados na Educação para a Paz construído por meio de uma Arte especial, a Arte de Amar, cujos pontos se resumem em cinco: Amar o Inimigo; Amar a Todos; Amar o Próximo; Colocar-se no Lugar do Outro; Ser o Primeiro a Amar.
O X Simpósio de Educação para a Paz (EPP) foi também um laboratório desse Amor, nas minucias, como propuseram os representantes da Escola Sempre Viva, do Estado da Paraíba: cada participante deveria cuidar de um ou uma outra durante aquele fim de semana. Todos e todas foram estimuladas ainda a compartilhar seus talentos, naquelas 36 horas de simpósio, o que causou impacto em pelo menos a metade dos presentes, estreantes no simpósio que, como os demais, foram acolhidos no ambiente da Mariápolis Santa por Iolani Claudino, Mestra em Ciências da Religião, e Eduardo Felinto, Mestre em Ciências Sociais, e Miriam Borges, especialista em Psicopedagogia.
Orquestra e modelo
A Orquestra Talentos a Serviço da Paz, que abriu os trabalhos do sábado, é formada por alunos da Escola Santa Maria, localizada na Mariápolis, onde também fica um dos centros de formação do Movimento dos Focolares. E essa escola tem sido uma grande impulsionadora da Educação para a Paz, pois é considerada modelo desse modo de conduzir a Educação e o Ensino. A instituição baseia sua metodologia de ensino na proposta de Chiara Lubich de vivermos essa Arte de Amar no Cotidiano. Como? Quem explicou foi Ana Teresa Vasconcelos, socióloga e educadora e com diversas experiências do dia a dia inclusive no acompanhamento de inúmeras famílias que procuram vivenciar a Arte de Amar, o que muda seu modo de estar-no-mundo, tornando-se abertas à perspectiva de construir um mundo unido, igualitário, justo, livre do egoísmo e fraterno.
O dentista e educador Richardson Borges deu também um depoimento sobre as raízes do Projeto Educação para a Paz a partir da Arte de Amar, fincadas no mundo em um congresso mundial para adolescentes, realizado há 23 anos, Japão, a 1a. CONFERÊNCIA MUNDIAL JUVENIL PARA O FUTURO. Na época, adolescente e integrante da delegação do Movimento Juvenil pela Unidade (MJPU), Richardson foi um dos milhares de signatários da Carta – um Apelo à Paz – aos governantes das nações, aos responsáveis civis e religiosos, aos responsáveis pelos meios de comunicação e às organizações nacionais e internacionais que trabalham pela Paz no Mundo. Um apelo que cabe bem para o Planeta, ameaçado pela crise ambiental e 34 guerras na atualidade.
Depoimentos e publicações do X simpósio de Educação Para a Paz
Em vídeo, a educadora e neuropsicopedagoga Lúcia Cardoso, hoje no Quênia, África, recordou o trabalho pós conferência juvenil na Escola Santa Maria, da Mariápolis homônima, que resultou em uma lei que instituiu e expandiu a Educação para a Paz nas escolas no município de Igarassu e no Estado de Pernambuco. E na sequência, Rivaneide Nogueira, Mestra em Sociologia da Educação, e Carlos Arruda, Mestre em Gestão Pública, anunciaram o lançamento do volume III da série de livros sobre as vivências ligadas à EPP, organizado por Maria José Luna, Miriam Borges e Eduardo Santiago, e os autores da publicação compartilharam o conteúdo de seus textos com os presentes, divididos em grupos.
A formação dos grupos serviu para aprofundar, durante o resto da manhã e a tarde do sábado, as Trilhas da Arte de Amar e compartilhar vivências como a da Associação das Crianças e Adolescentes (AACA) da Ilha de Santa Terezinha, que trabalha a Educação para a Paz no contra-turno das escolas da comunidade localizada em Santo Amaro, área central do Recife. Durante os encontros de grupo e o almoço, os participantes do simpósio ainda puderam interagir entre si e com os autores das diversas abordagens sobre a Educação para a Paz, contidas no terceiro livro sobre o tema do simpósio. O objetivo era inspirar a elaboração de novas propostas e estratégias para viabilizar a atuação inspirada na Arte de Amar.
“As vivências e os impactos de transformação social apresentadas no X Simpósio e no volume III comprovam a tese de Chiara Lubich de que, a vivência da Arte de Amar nos levará a um mundo de paz e de fraternidade”.
Afirmou Cristina Lira.
No Mestrado em Economia, a arquiteta introduziu os princípios de uma economia baseada na comunhão nas atividades de agricultores sem-terra em uma ocupação no município de Branquinha, no Estado de Alagoas. Iniciado há 20 anos, o trabalho produziu muitas conquistas, dentre as quais o desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis como a produção de alimentos orgânicos com selo de reconhecimento e qualidade. E ainda: a fundação de um instituto – o Instituto Mundo Unido – que permite a formalização de novas parcerias e projetos inspirados na Arte de Amar.
Inclusão e cuidado
A programação do dia central ainda integrou uma Dinâmica de Inclusão, conduzida por alunos de um projeto de extensão da UFCG- PB e a docente Hermília Aires, seguida de uma exposição sobre O Cuidar do “Outro” na Perspectiva da Arte de Amar, realizada pelo Reitor da mesma IFES, o Professor Antônio Fernandes, e a Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Dom Hélder Câmara, Maria José de Matos Luna. E completou-se com uma exposição relativa à Gestão Financeira Escolar Voltada para a Educação para a Paz, sob a condução da Administradora por Isabella Tavares C. Barreto, e a Psicopedagoga Miriam Borges.
No domingo, à exposição da socióloga Vera Araújo, aqui destacada, seguiu-se uma reflexão sobre os cuidados com a saúde e o bem-estar emocional, individual e coletivo, promovida pelo médico Wilson Oliveira Júnior, da Universidade de Pernambuco. (UPE). Médico de experiência reconhecida, o doutor Wilson apoiou a implantação da disciplina EPP na UPE como coordenador o Projeto no Ambulatório de Doença de Chagas (DC) e junto à Associação dos Portadores de DC e, no simpósio, tratou com leveza e profundidade de um tema que aflige a vida universitária e em sociedade, principalmente após a pandemia: a depressão e outras doenças psíquicas causadas pelas rotinas estressantes predominantes na Contemporaneidade. Recebeu as homenagens da dos organizadores do simpósio, por ter introduzido a disciplina de Educação para a Paz na UPE, como ressaltou a cardiologista Lúcia Costa, em nome dos organizadores do Simpósio.
Propostas e propósitos
No fim da programação, houve uma ampla partilha de conclusões – com 42 linhas de atuação. No Grupo dedicado à Família, uma das cinco intenções dos presentes é estender o Amor aos parentes mais distantes e exercitá-lo com mais intensidade em casa, por meio de pequenos gestos. No Grupo do Social, duas das seis propostas são: formar líderes comunitários nos princípios da Educação Para a Paz e fomentar parcerias para expandir o projeto. No da Saúde, as ideias giraram em torno da criação de vínculos com as pessoas e da sensibilização aos comportamentos propostos na Arte de Amar, sobretudo junto aos colaboradores que lidam com o atendimento ao público para que se coloquem no lugar dos pacientes atendidos pelo serviço de saúde.
No Grupo da Educação Básica, três das 10 novas ideias são bastante originais: produzir fábulas infantis cuja moral serão os pontos da Arte de Amar; levar para as escolas a ideia de construir, em cada uma delas, uma “árvore da positividade”, com placas que levem a refletir sobre a PAZ; e propor a disciplina da Educação para a Paz para toda a rede de ensino. O Grupo do Ensino Universitário produziu 5 linhas de ação que vão do acolhimento e da escuta dos docentes e discentes a projetos que conquistem amorosamente ambas as categorias a um maior protagonismo em favor da paz.
O Grupo das Secretarias Municipais de Educação construiu 13 propostas, o que demonstrou o compromisso que as gestões públicas assumem com a Educação Para a Paz. Dentre essas propostas, destacam-se: colocar a disciplina correlata na grade curricular; envolver os vereadores no projeto; promover um seminário da EPP em cada município; inserir o tema da EPP nas jornadas pedagógicas; envolver os professores nessa iniciativa (fazer com que eles se encantem com o tema da EPP); ter o cuidado de preservar a laicidade do projeto.
Galeria de fotos do X Simpósio de Educação Para a Paz
Fotos por Rivaneide Nogueira e Amauri.
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